Segredos ou talvez nãoSuponho que nunca dei muita água pela barba ao meu pai nem justifiquei adrede a ira da minha mãe.
Não houve assim grandes razões para que me pusessem de castigo ou impusessem algum tipo de sanção acessória.
Caso tal impendesse sobre mim, uma das mais temidas seria com toda a certeza obrigarem-me a assistir a um espectáculo de circo.
Dado o receio, suponho ainda que escondi o melhor que pude a minha aversão pelo espectáculo circense, identificada pelas erupções cutâneas quando submetido a doses homeopáticas via televisão.
Tivesse um herdeiro e, em caso de sanção e sendo também secretas as suas aversões, desconfio que o submeteria à provação de escutar um painel de defensores acérrimos do politicamente correcto.
Se se desse o caso de tal não servir de correctivo, na certa deserdá-lo-ia.
por MCV às 22:28 de 10 junho 2005 
Bravenet e GoogleSuponho que não será nem por acaso nem facto alheio à nossa condição de portugueses que o Bravenet há tempos nos presenteia com este banner:

Eu vejo parecenças. Quanto mais não seja no desenho dos óculos.
Quanto ao Google, não cessa de me espantar.
Depois de uma série interminável de procuras de informação sobre a
febre da carraça, há agora uma clara tendência para a repetição de
pesquisa por palavra.
Não menos interessantes mas apenas pontuais, as seguintes:
Vacinas frase célebremaquina de tornear (argumentos)dianteiro poca azule a melhor de todas
o google trocou o desenho
por MCV às 17:34 de 09 junho 2005 
A cidade e as serrasNão faço ideia se existe na literatura portuguesa do século XX, uma obra que se detenha nessas diferenças e mostre um contraste tão vivo como o dos tempos de Jacinto.
E se não existe, é pena.
Ocorreu-me isto ao tentar abrir a porta do prédio citadino com a chave de um dos montes.
A minha vida decorreu de facto entre a cidade e as serras.
Entre um século XX de néons e minissaias e um outro de carros de parelha, cantares de taberna e galinhas chocas.
O detalhe da chave é importante. Não havia lá para o sul, nos meus domínios, fechaduras do tipo Yale. Eram ainda as mesmas chaves dos séculos passados.
imagem de http://www.wilton.force9.co.uk/lock/mechanism2.htm
por MCV às 17:13 
FoguetesA última vez que vi foguetes serem lançados com a sua inicial razão de ser, já lá vão uns bons doze anos.
Em plena via Infante de Sagres, um indivíduo assinalava um acidente de automóvel com recurso a esse método ancestral. Suponho que o não fizesse em vão. Suponho que seria uma combinação de emergência com alguém ali nas imediações, na falta de telefone. Ele aparentemente surgira de uma casota ali perto não me recordo se numa pedreira se noutra instalação qualquer.
Há dias que venho a ser massacrado por esta deslocada forma de anúncio festivo.
Isto em meio urbano faz cada vez menos sentido chamar os romeiros de tal sorte.
Também sei que os foguetes sofreram uma evolução semântica. Já não sinais sonoros e de fumo, apelando à concentração. São acessórios de fogo de artifício. Foguetes e morteiros. Estes últimos então profusamente utilizados. Bombardeamentos matinais e nocturnos.
It's a nice day (for bombing) - como parecia dizer um apresentador da meteorologia num canal internacional, sorrindo face à ausência de nuvens sobre a Sérvia, no tempo em que dois dos nossos aviões sobrevoavam o Adriático, ficando assim à porta da horta, seis anos atrás. Sim, estávamos em guerra na televisão.
It's a nice day for fireworks!
por MCV às 05:05 
ConjugaçõesConjugam-se os factores.
E conjugam-se os verbos controlar e circunscrever sem que se saiba o que significam.
Até ao momento, 27 teclas e 3 dedos estiveram envolvidos neste texto.
por MCV às 19:46 de 07 junho 2005 
CalorinaSempre fui mais do calor do que do frio.
Talvez que seja algo inscrito nos genes, trabalhados por séculos de suões. Tanto quanto aceito que os organismos se adaptam à envolvente.
Tive sempre a sensação de que a minha temperatura de funcionamento era superior a 30º. Uns poucos graus abaixo da temperatura do corpo.
Esta sensação foi alimentada por muitos episódios. Por muito trabalhinho feito à torreira. Muitas caminhadas pelo poeiredo sem o mínimo sinal de desfalecimento.
Também pelo prazer de tomar banhos ao meio-dia do sol.
Pelas noites longas de grilos ou de caça às gatas.
De cantorias nos bancos do largo ou em círculos de cervejas, sobre as grades das ditas.
Gosto do calor. Mas dou-me por satisfeito que dure apenas um Verão.
Já este Partido Regenerador e este Partido Progressista parecem agonizantes. Quanto durarão?
por MCV às 03:45 
Ut queant laxis - Dêem-me música
imagem em http://perso.wanadoo.fr/radio-retro/R-Saba-freudenstadt01.jpgHá alguns séculos-rede que conheço
a emissária desta cadeia. Foi ela quem quase me obrigou a facultar os comentários às visitas e a aceder a conversar em janelinha.
Há igualmente outros tantos séculos-rede que me preparo para escrever um post sobre música.
A minha relação com a música pauta-se pela total incapacidade em distinguir um sol de um ut. Mete dó.
Claro que sei da relação entre frequências e comprimentos de onda e das convenções respectivas. Mas isso de nada me serve.
Como se ao olhar para um azul não soubesse que nome dar-lhe. A verdade é que não distingo as notas musicais.
Não me gabo disso. Nem com a sobranceria ridícula dos que se dizem orgulhosamente avessos à Matemática nem com a suposta fleuma dos que se vêem compensados por terem outros dons.
Não me gabo. Tenho pena. Mas suponho que não está ao meu alcance dotar-me das capacidades para tal. Resigno-me, é só.
A verdade é que a minha relação com a música foi marcada em grande parte pela sua ausência.
Ausência que se traduzia por um aparelho de rádio avariado e pela inexistência de fonógrafos lá em casa.
A música resumia-se em grande parte ao que se extraía da televisão e às noites em que adormecia embalado pelas vozes avinhadas da taberna, nas traseiras da casa alentejana.
Mas há um dia que guardo na memória.
Num hotel de província, num lusco-fusco da minha meninice, vindo talvez do bar ou da rua, ouvi uma embaladora música ao fim do corredor. Como se um flautista me chamasse, lá fui. Na pequena sala, um aparelho semelhante ao lá de casa e um homem sentado placidamente ao escuro. Fiquei à porta, temendo importuná-lo, mais do que isso temendo importunar a música.
Não faço ideia que peça era. Suponho que a sintonia era a do Programa 2.
Uns tempos depois, resolvi mandar o dito aparelho à revisão. Veio de lá como novo. Depois disso, exigi um gira-discos. Mais tarde, um gravador de cassettes. Pouco depois, um rádio portátil.
Muni-me assim do essencial à experiência. Não julgo que tenha, no entanto, qualquer importância este atraso na minha incapacidade.
Desde então, como quase em tudo na vida, não sou capaz de descodificar os meus critérios. Mas no caso da música tenho a quase plena consciência de que nunca procurei mais do que me era casualmente oferecido.
Recordo-me bem do som das juke-boxes algarvias dos meados dos anos sessenta. Das doses sucessivas de Roberto Carlos. Das grandes orquestras que o meu tio apresentava no leitor de cartuchos do carro. Dos inúmeros discos de 78 r.p.m. que ele possuía e das capas amareladas de onde os tirava. Dos sons que gravava num já então velho Grundig de bobines.
De tudo isso me recordo.
Um destes dias, meti-me a reconstruir essa banda sonora. A que desde esse tempo me acompanhou.
Assim sendo, querida
Lili, a resposta só pode ser esta:
Volume total de arquivos musicais no meu computador:
2,60 GB (2.797.338.624 bytes) - é o que ele diz e eu acreditoO último CD que comprei foi:
O único CD que comprei, na esperança de vir a ter um aparelho para os ler (nessa época nem sei se já havia um PC cá em casa) foi aquela reedição parcial dos famosos discos de capa de serapilheira, da recolha de Michel Giacometti.Última música capturada:
"Minha terra tem" do grupo coral de Vila Nova de Milfontes - tirada daquiMusica que estou ouvindo neste momento:
Um CD de música grega (candiana, para ser mais preciso) do qual esperava extrair uma faixa para enviar à minha amiga.Cinco músicas que andei escutando bastante, nestes últimos dias:
Todas aquelas que fazem parte das playlists da TSF e da Antena 1. É um sinal dos tempos que estas playlists sejam cada vez mais curtas.Música objeto do desejo:
"O cigano do amor" claro. Pelas razões expostas aqui e aqui.Quanto ao destino da cadeia, decidi dar carta branca a quem a quiser.
Aqui estão ambas as três.

Basta que digam que vão daqui.
por MCV às 23:58 de 05 junho 2005 
Variante 
Há uma dúzia de anos e a caminho de casa
por MCV às 13:29 