Não sei quantos minutos por cada cigarro.
Não sei quantos minutos por cada copo a mais.
Não sei quantos minutos por cada noite sem dormir.
Não sei quantos minutos por cada avaria.
Depois, abalas assim. Logo tu, que sempre fugiste das avarias.
Estatísticas.
Um modo de perceber o funcionamento dos grandes números quando não se percebe nada dos pequenos.
R.I.P.
Como quase tudo o que dizia, era necessário atenção e ouvido fino para perceber a lógica da argumentação.
Mesmo que falasse, vez ou outra, um pouco mais alto e claro. Como quando retorquiu que homem que se preze, tem que de vez em quando esquecer a educação e soltar umas imprecações.
Mas as mais das vezes eram sussurros, monólogos, pequenas pérolas de reflexão ao alcance de quem se detinha a ouvi-lo.
Nesse dia, vinha desengravatado.
Após algumas considerações sobre a tomada de Ceuta, a natação medicinal e a composição química do recheio das mais diversas sanduíches, pronunciou três palavras mais, com os olhos postos nas nuvens:
"A gravata Dei."
Encarámo-nos, na expectativa de mais uma revelação.
Afinal, era sempre com surpresa que o escutávamos.
"A gravata... dei. Dei-a mesmo!"
Eu nunca sei até que ponto é que um discurso político é o reflexo das ideias do orador ou o reflexo daquilo que ele pensa que deve dizer.
Sendo que, se é o segundo caso, nunca sei para que receptor ele fala. Convenço-me de que ele também não o sabe.
Vem isto a propósito dos dois casos recentes de invasão de áreas chave do poder e da sua representação, ocorridos em Londres.
Não fossem os intervenientes (nos outros dias da sua existência) pacatos cidadãos, e sim perigosos terroristas e a esta hora haveria mais uma tragédia a lamentar.
E aqui é que bate o ponto.
Todo o discurso político recente na Rússia e nos Estados Unidos, contaminando outras paragens, se deteve na condenação dos seus próprios dirigentes por não terem conseguido conter a ameaça terrorista.
Depois de termos assistido à crucificação de Putin, a propósito do atentado na escola, depois de termos ouvido tudo o que se disse àcerca da forma como se actuou nos Estados Unidos antes do ataque às torres, depois de termos ouvido tudo isso, até parece que há uma fórmula mágica para evitar ataques terroristas.
Pois não há.
O velho aforismo "casa roubada, trancas à porta" é, para mim, o exemplo claro do absurdo.
Particularmente nestes casos em que se corre a tomar medidas para evitar a repetição de uma forma de actuação terrorista, quando se sabe que, com toda a certeza, o próximo passo será outra surpresa.
Não que não se deva dificultar a repetição. O que é preciso é dificultar todas as formas possíveis e imaginárias de causar grandes estragos.
Estou convencido de que há gente a tratar disso. A pensar em todas essas formas e a engendrar maneiras de as evitar.
Mas se ocorrer um ataque em grande escala ou com grande impacto no poder instituído, é apenas porque o inimigo foi mais forte, mais matreiro. Não faltam fábulas a respeito.
E golpes, iremos sofrer mais. Se eles não temem nenhuma das nossas armas, se não têm qualquer receio de avançar, resta-nos estar um passo à frente e tentar detê-los.
Mas estando a surpresa sempre do lado de lá, veremos que nem sempre isso se consegue.
Agora há de facto surpresas como as de Londres que nos levam a pensar que só se olha para as mochilas nos comboios e para as facas nos aviões.
E quanto aos mesmos aviões, na Rússia, a ser verdade o que se soube hoje, parece que qualquer prevenção há-de ser sempre furada pela corrupção instalada.
Num grande número de casos, quando ocorre um acidente, é possível ter conclusões preliminares com as observações feitas in loco, nas horas seguintes.
Conclusões no que diz respeito às causas directas, bem entendido.
O que demora é apurar uma ou outra causa indirecta e as responsabilidades quer nos erros quer nas omissões.
Mas quando, face a um acidente qualquer que seja, assistimos ao espectáculo de ver (ouvir) alguém afirmar que não falhou nada, apenas ficamos com uma noção da capacidade de quem produz tal dislate. Só isso.
Não falhou nada e todavia...
Depois da fase do a quente, em que se ouvem estas e outras pérolas, segue-se a fase do aproveitamento.
Em que vêm à tona toda a sorte de reivindicações relacionadas ou não com o ocorrido. Sempre em maior número as que não têm ponta por onde se lhe pegue, é claro.
À medida que o inquérito avança, o ruído de fundo não cessa, deixando adivinhar as pressões para que se veja isto e não aquilo.
Quando por fim, se conhecem as conclusões, é certo que se vão buscar pilhas de assuntos que não vêm ao caso. Quase sempre se fica sem saber o que é que aconteceu e porquê.
Já só se discutem aspectos que em nada concorreram para o sucedido.
E o que realmente interessa, saber o que correu mal para se evitar que aconteça de novo, nos mesmos moldes, isso realmente não interessa nada.
Este verão foi chocho. Até parece que adivinhei quando o disse aqui no final de Maio.
Durante anos, a minha praia foi em Setembro. E olhando agora pela janela, sentindo o fresco que vem lá de fora, fico na dúvida: Será que os Setembros já não dão praia?
Nota: este postal ilustrado impresso nas oficinas do "Commercio do Porto" encontrei-o nesta página, juntamente com outros postais de faróis da nossa costa.
Às vezes, parece que é altura de fazer um peditório ou iniciar umas "démarches" para conseguir um verbo.
Mas, se calhar, é mesmo melhor estar calado.
Se a verborreia é má - eu acho que é - também a falta de verbo não ajuda a quem teve esta ideia de aqui ir escrevendo umas coisas.
Mas não me queixo.
Estas coisas são assim mesmo. Uns dias dizem-se uns disparates, outros frases sem sentido e às vezes, uma coisinha de jeito.
E há estes, com falta de verba, digo, de verbo.
Dizer qualquer coisa para não estar calado. Há alguma palavra para designar não o que se cala, mas o que não escreve?